Sendo jovem, no que pareceu uma simples loucura, Amélia Robles Ávila acabou encontrando sua liberdade. A garota da fazenda, criada no conservador México no final do século 19, apenas tinha acabado de passar da adolescência quando decidiu ingressar na Revolução Mexicana. Nascida em 3 de novembro de 1889 como Amélia Malaquías Robles Ávila em uma família rica no estado de Guerrero, no sul do México, nas montanhas de Xochipala sua vida era o campo, sem muitas janelas para o mundo. As possibilidades de sua família deram-lhe uma educação muito religiosa em um colégio para moças, as Filhas de Maria Imaculada da Medalha Milagrosa. Na escola já tinha alguns sinais de rebeldia, e também seguia muito a uma parceira, procurava manter um relacionamento com ela. Até que chegou um momento em que os papéis, os bons costumes, os espaços, tudo se dilui para que ela se tornasse o que queria ser. E se converteu em Amélio Robles Ávila, um dos primeiros casos documentados de uma pessoa trans no México.
A batalha de Amélio
Os grupos contrários ao então governo do general Porfirio Díaz, liderados por Francisco Madero, pegaram em armas em 20 de novembro de 1910, dando início à Revolução Mexicana. A”bola” video bingo, como eram chamadas as multidões que recrutavam guerrilheiros nas cidades, passou por Xochipala e como tantos outros jovens chamou a atenção de Amélia Robles. Esse grupo armado foi o nascente Exército de Libertação do Sul, liderado por Emiliano Zapata, um dos líderes mais importantes da Revolução Mexicana que lutou pela justiça agrária. A causa não era o principal na mente da jovem Amélia Robles. Sua ideia era ser completamente livre. Na luta armada alcançou a patente de coronel, vencendo todos os preconceitos de uma época em que um “homem” não devia dar sinais de não ser. E o mais importante para si mesmo, nos campos de batalha forjou sua nova identidade, a qual mostrou ao mundo para o resto de sua vida.. A Revolução passou a ser seu pretexto, seu caminho, seu trânsito, para fazer e conseguir finalmente o que ele queria ser.
O importante era sobreviver
Na história da Revolução Mexicana, costuma-se apresentar a participação das mulheres no papel das “soldaderas” ou “adelitas”, encarregadas das tarefas de apoio às tropas. No entanto, elas também tinham um papel armado em que muitas vezes tinham que adotar a aparência de um homem para progredir. Alguns até tiveram que mudar seus nomes. Houve muitas mulheres que entraram para as filas como soldados, porque havia uma coisa que tinham que fazer e era se tornarem masculinas. Nesse sentido, Amélio não era o único, há outros exemplos. Petra Herrera foi o revolucionário Pedro Herrera; Ángela Jiménez tornou-se Ángel Jiménez em combate. Também adotaram uma identidade para poder comandar a tropa, algo que sendo mulheres teria sido impossível. Ao término de sua participação na Revolução, personagens como Petra Herrera e Ángela Jiménez voltaram às suas cidades para continuar sua vida de mulheres. Mas o caso de Amélia Robles foi diferente. A decisão de Amélio Robles de viver plenamente sua identidade de gênero durante a Revolução Mexicana foi libertadora para ele pois se tornou o homem que desejou ser desde a infância. E o que a história mostra é que Amélio Robles serviu à Revolução Mexicana e dela aproveitou, para continuar o resto de sua vida no caminho que aquela jovem ranchera de Xochipala estava procurando.