O filósofo Friedrich Nietzsche asseverava que o amor é o estado pelo qual nós vemos as coisas tal como elas não são. Enxergamos qualidades inexistentes, criamos cenas nas quais todos os nossos ideais românticos são realizados por uma só pessoa. Amar é regozijar-se com um desejo, pela possibilidade de desfrutá-lo, é de um júbilo indizível, no entanto, dificilmente reparamos o estrago que isso causa em nossas vidas.
Romeu e Julieta morreram, e, dessa forma, Shakespeare nos aconselhou sobre o perigo no amor. Mais tarde, Camilo Castelo Branco, autor romântico Português, escreveu ‘’Amor de Perdição’’, o título diz tudo. Um final trágico movido pelo afeto mais destrutivo: a paixão amorosa.
O romance, como todo paraíso, esconde em seus escombros, um inferno. Qualquer um entende que o desejo mais forte é aquele que nunca é realizado, é apenas alimentado, e alimentado e nunca saciado.
Há quem diga que o casamento na idade média durava muito mais tempo, porque se casava por propriedades, escolha dos pais, enfim, qualquer coisa, menos amor. Desde que inventaram essa coisa de se casar por amor, tiveram que inventar o divórcio, para limpar a sujeira.
Os casamentos do século XXI duram 24 horas, quando muito! Mas, indubitavelmente, se multiplicaram. As pessoas casam uma, duas e até seis vezes; comprovando, assim, o que Bauman aludiu em seu livro, “Amor líquido”: que nós tentamos compensar a falta de qualidade de nossos relacionamentos com a quantidade.
Em uma conversa que tive com uma amiga, falávamos sobre o relacionamento no qual ela estava inserida naquele momento, ela me dizia que queria permanecer em um relacionamento amoroso apenas até os 22 anos, e, que dali pra frente, gostaria de seguir a vida de solteira. A conclusão que tirei: os relacionamentos contemporâneos têm data de validade, como qualquer outra mercadoria.
Calma, leitor, eu não endeuso o passado, não sou um conservador. Sou apenas um leitor de Bauman.
Voltando ao tema que citei acima – do amor como uma mercadoria com data de validade – o que você me diria? Já sentiu aquela forte paixão se transformar em tédio? Não minta. Eu tenho certeza de que já. Lembre-se de que não estou falando do sentimento que o seu pai e a sua mãe sentem por você.
Se o amor tem data de validade, quanto tempo dura o amor? É possível amar quando o nosso corpo entra em declínio, quando o nosso mau humor, as rugas e a fraqueza, tomam conta de nossas vidas? Com o tempo, o amor dá lugar ao companheirismo, para tentar, talvez, eclipsar o ódio causado pela convivência, e aquela toalha molhada deixada em cima da cama, que antes era motivo de sorriso, agora é motivo de uma briga que desencadeia vários outros conflitos pretéritos.
Fomos ludibriados, quando crianças, a buscar uma cara-metade, a peça que falta em nossa vida. Eu prefiro dizer que o amor passa longe disso, na verdade, o amor é uma mão que espalha todas as outras peças de nossas vidas, incumbindo-nos a tarefa de reorganizar todas as peças em uma posição confortável para desfrutar inteiramente deste afeto.
Ame com todas as forças. Sofra. O sofrimento fortalece como diz o bigodudo Nietzsche, em um de seus aforismos. Uma vida sem amor não vale a pena ser vivida, mas, lembre-se: em todo paraíso há sempre um inferno.
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