Alguém já deve ter assistido a um filme produzido em 1995 chamado “A Princesinha”, daqueles que pretendem ser infantis mas acabam sendo para todas as idades; é algo como um mito moderno, com um visual deslumbrante. Lá pelas tantas, no filme, a menina Sarah, a princesinha do título, dispara a seguinte frase para a Srta. Minchin, mulher amarga e fria que a acusara de não ser mais uma princesa, pois seu pai morrera na guerra e a deixara sem nada: “Todas as mulheres são princesas; ainda as que não são belas, ainda as que já não são jovens… todas as mulheres são princesas! É um direito nosso! Seu pai não lhe ensinou isso? Não lhe ensinou?”
Quando busco na memória por belas imagens de filmes assistidos, esta cena é lembrada sempre com muito carinho, quase como se fosse uma “profissão de fé”: eu sou uma princesa, todas nós somos! Como pudemos duvidar disso?
Neste momento, passa por mim uma elegante jovem com saltos altos e finos; acho curioso como é natural na mulher saber que o belo vale mais que o cômodo; como sabe que, quanto menos tocar no chão, quanto mais buscar o elevado, o celeste, mais bela e delicada ela fica; é quase que uma intuição (atributo que também é forte no feminino). E os sentimentos femininos? Todos tendem também para o céu; importa muito pouco a aparência física de alguém, se este alguém é honesto e gentil, ou se é frágil e desprotegido, e necessita de nossa atenção. Pode se tratar de uma plantinha ou de uma flor, um pequeno animal ou uma pessoa… Nossos sentimentos sempre usam “saltos altos”: admiram e cultivam a alma dos fortes, ou envolvem e acalentam os frágeis, motivadas por esta explosão de realização que traz, para qualquer mulher, a oportunidade que a vida nos dá de transbordar amor, o qual se realiza no próprio ato de “transbordar”, e se basta a si mesmo.
contínua e tenaz, capaz de velar pela vida por todas as noites que esta mesma vida nos oferecer, sabendo alimentar-se do bem estar e crescimento do outro como única e valorosa recompensa. Penso que até as plantas do jardim se sentem mais serenas quando uma mão feminina as cuida; sentem que esta mão não faltará, que sempre estará ali, ainda em dias de tempestade. Pois cuidar da vida no meio da tempestade tem algo de heroísmo e glória para o feminino, que nunca recusa esta oportunidade.
Como sabemos mergulhar no mundo mental com objetividade e prática, buscando a solução para aquilo que necessitamos resolver! O ato de custodiar não permite protelações ou divagações, pois a vida tem seus ritmos a serem respeitados. Sempre voltamos deste plano com o alimento de que necessitamos: temos tantos filhos à nossa espera!
Outra curiosidade é que talvez nosso principal adorno seja uma grande pedra de ímã: tudo e todos se agregam à nossa volta; somos ponto de encontro, de harmonia e de união. A matriarca, madura e ponderada, é sempre o coração de todo clã.
E o nosso coração? Ah, se os cavalheiros soubessem como é ousado o sonho do nosso coração! Dizem os conhecedores que o arquétipo feminino em relação a todo cavalheiro se identifica muito bem com o personagem Lancelot, da saga do Rei Arthur: idealista, nobre, a serviço de uma causa humana, maior do que sua própria e simples existência material.
Como nosso amor é, por definição, idealista, idealizador e celeste, sempre guardamos a propriedade de poder presentear asas a quem amamos; como é triste guardar estas asas eternamente, pois não encontramos ninguém que queira voar…
Quando eu era pequena, acreditava firmemente que as libélulas eram fadinhas encantadas por uma bruxa malvada, tocando as águas em busca de encontrar seu antigo reflexo… Hoje, penso que as mulheres são libélulas encantadas pela maldição do esquecimento de sua própria identidade; esquecem que devem apenas roçar as águas do mundo material com “saltos altos”, delicadamente, formando círculos concêntricos infinitos, e que sempre devem ter um duplo par de asas, pois há que ter um de reserva… Sempre pode haver alguém, por aí, que entenda a caminhada de Lancelot, a necessidade das princesas e o sonho das libélulas. Neste sonho, reside a nossa única, real e legítima identidade; afinal, nossos sonhos também são nossos filhos, a serem cuidados e alimentados…
Lúcia Helena Galvão
Diretora adjunta de Nova Acrópole Brasil
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