Por Nara Rúbia Ribeiro
O cárcere é um lugar de privações e silêncios. A paisagem da alma se vê permeada por vãos. A distância dos filhos, dos pais, dos amigos. Não raro o total abandono do parceiro. O isolamento. O pavor de ser esquecida, não lembrada, não mais amada.A aflição de ver-se vencida pelo tempo, na procrastinação infinita do amanhã.
Nessa privação em que a angústia substitui a liberdade, há um campo fértir para toda a sorte de sentimentos. Ali, um olhar atento é capaz de ver aflorar a poesia e, se possível, transformá-la em poemas.
Isso é o que podemos constatar em “Mulheres Poéticas – Poesia no Cárcere”, uma coletânea de poemas elaborados por mulheres encarceradas na ala feminina do Presídio Regional de Mafra, na cidade de Joinville.
O projeto é resultado de uma parceria entre a Vara de Execuções Penais de Joinville/SC com a Giostri Editora e trouxe-nos duas possibilidades extraordinárias. Primeiramente deu voz às mulheres presas para que expressassem as suas emoções, os seus medos, as suas dores e utopias. Em segundo lugar, presenteou-nos dando a este país uma prova incontestável de que atrás de suas grades há almas que sonham e há mentes pensantes.
A resiliência é suporte de esperança nas palavras de Bruna Martins que, quando menina, sonhou “Ser formada em Direito”:
“Não adianta lamentar o passado,
Mas sim aguardar com esperança
O fruto da semente do bem que hoje plantamos”
Já Ironilda Cruz ressalta que “Amigos nem sempre têm asas”, mas alerta para o poder curativo da amizade especialmente para aqueles que estão privados da liberdade: “Eles vêm de mansinho trazendo/ Paz para um coração machucado/ Insistem em estar ao lado e/ Não deixam a tristeza virar rotina”.
Liamar Maia descreve com maestria a vida no cárcere:
No poema “Vida lá fora”, Liamar Maia nos exorta para a importância do que somos, e não aquilo que falam de nós: “Pense no que você é,/ Não no que os outros falam ou pensam”.
Nesse mesmo poema, ela abre o seu coração aos próprios sonhos e vaticina:
“Um dia tudo passa e seremos todos livres,
Pagamos por nossos erros e vamos sair de cabeça erguida,
Dar o melhor para não se arrepender,
Começar tudo de novo.”
Ler estes e diversos outros poemas das poetisas aqui citadas (e de outras poetisas que fazem parte do projeto e integram o livro) reaviva em nós a crença que a poesia nos une a todos, dentro ou fora das grades. Livres ou encarcerados, a literatura nos faz convergir aos mesmos sonhos, às mesmas dores, às mesmas angústias do existir.
Parabenizamos a Giostri Editora pelo belo trabalho, bem como a Vara de Execuções Penais de Joinville/SC pela incansável missão de mostrar ao mundo o poder libertário da literatura.