É realmente fácil separar os homens dos animais? Bom, no final das contas também somos animais, temos estruturas orgânicas semelhantes a de vários outros mamíferos e entre 98 e 99% de DNA é compartilhado entre chimpanzés e humanos. Como fazer para determinar esse 1%?
Seria a capacidade humana em sentir dor? De certa forma, não. Insetos possuem impulsos que fazem com que se afastem ao sinal de perigo. Talvez o domínio das emoções – e, no mesmo sentido, a racionalidade e poder, no sentido amplo da palavra, de concretizar ideias e modificar o meio.
Numa sociedade cada vez mais carregada de informações e necessidade de relacionamentos com muitas pessoas – seja pessoalmente ou, cada vez mais, virtualmente – é extremamente necessário que haja esse poder de controlar e dosar essas emoções. Não necessariamente manipular, dado que essa palavra acaba tendo uma conotação negativa por vezes: mas ser inteligente na mesma medida em que se é com ciências exatas e humanas.
Pode não parecer, mas é possível. A chamada inteligência emocional é um termo em voga já algum tempo e chegou ao mainstream por volta de meados da década de 1990 com o livro homônimo – Inteligência Emocional – pelo PhD Daniel Goleman. Não se trata necessariamente na habilidade de poder manipular os outros ou em desenvolver relacionamentos líquidos e artificiais – como alguns livros ensinam, tal qual Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas, best-seller de Dale Carnegie. Tampouco é estar feliz o tempo todo – já que isso é impossível – ou em sentido contrário, agir como um robô ou um fantasma.
Inteligência Emocional é entender como as emoções se manifestam, determinar que tipo de emoção está ocorrendo e como tirar melhor proveito de modo a lhe ajudar com suas necessidades. Não possuir essa habilidade – ou ser carente nela – pode resultar em revezes e consequências negativas na vida de uma dada pessoa. Por exemplo não saber distinguir quais atividades do dia-a-dia são as mais importantes ou não conseguir se relacionar com os demais de modo e maneira apropriadas.
Aos poucos, a temática da inteligência emocional vai sendo ensinada para as pessoas como algo facilmente inteligível e cuja cognição pode melhorar a qualidade de vida. Um bom exemplo nessa toada é o filme “Divertida Mente”, um dos mais recentes lançamentos da Disney/Pixar e que fora vencedor do Oscar de melhor animação neste ano. O argumento do filme se dá no sentido em que existiriam pequenas “pessoinhas” dentro de sua cabeça com um painel de controle que pode ser “infectado” pelas suas essências. Alegria, Raiva, Medo, Nojo e Tristeza se tornam “pessoas” singulares no que tange às emoções. A Alegria é alegre a maior parte do tempo, a Tristeza, triste. O filme consegue ensinar às crianças que existem as mais diversas emoções e por vezes elas podem se combinar – como a protagonista quando a Alegria e o Raiva se juntam num jogo de hockey ao mesmo tempo que o Medo mostra onde estão os adversários.
Dando alguns exemplos mais concretos talvez torne as coisas mais claras nesse sentido. O auto-controle como habilidade de alguém com alta inteligência emocional – ao que Goleman dá o nome de “QE” em oposição ao “QI” de “quociente de inteligência” – pode ser bastante útil em algumas profissões. Não que seja um rol restrito nesse sentido profissional, em realidade é bastante aberto.
O primeiro exemplo é para um jogador profissional de poker. Este tem de ser capaz de “domar” determinadas emoções como o medo, a angústia, a superstição e por vezes há pitadas de cansaço em longos campeonatos que fazem o controle daquelas mais embaralhado do que as próprias cartas que aquele vê pela frente. Há inúmeros artigos na internet que indicam como fazer esse sopesamento emocional que acaba começando com a determinação do que se está sentindo. “Não podemos confundir paciência com medo de se expor. Irá chegar um momento em que vamos ter que ir pra cima e para fazer isso na hora certa”, disse o profissional Giuliano Freitas em entrevista para o blog da PokerStars. Não confundir duas emoções ao saber quanto apostar em função da quantidade de fichas, qualidade dos demais jogadores e probabilidade de vitória acaba sendo algo extremamente importante para um profissional do poker.
Mas não só. Poderíamos ir bastante além nos exemplos. Falando especificamente do futebol – um esporte que, queira ou não, todos já vimos uma partida na vida – há um momento onde o controle emocional acaba sendo mais importante do que a habilidade ou a disparidade de talento entre os elencos: a cobrança de pênaltis para desempatar um jogo após tempo regulamentar e prorrogação. Reza a lenda que os alemães são bons cobradores de pênaltis porque sabem ter esse controle na hora certa e não dramatizam muito. Bom, há até fatos para comprovar: a última vez na qual a seleção alemã perdeu uma disputa de pênaltis numa grande competição foi há 40 anos, na Eurocopa de 1976.
A inteligência emocional é mais do que um mero termo da moda – nem poderia sê-lo, dado que há diversos estudos e livros sobre o assunto há mais de vinte anos. É uma capacidade tão desenvolvível quanto a inteligência acadêmica, o QI. Ambas acabam nos separando dos animais: tanto a capacidade de fazer cálculos para fazer uma ponte quanto separar os problemas pessoais da vida profissional quando fazer esses cálculos. De maneira figurada, já que dizem – igualmente de maneira metafórica, por óbvio – que o cérebro das emoções é o coração. a inteligência emocional nada mais é do que pensar com o coração.
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