A atriz Márcia Cabrita foi diagnosticada com câncer em 2010 e lutou, por 7 anos, contra a doença, tendo falecido ontem.
Com este trecho da fala da própria Márcia Cabrita, homenageamos todos os homens e mulheres que travam, cotidianamente, uma luta severa e dolorosa contra o câncer.
Texto de Marcia Cabrita
Eu fiquei gravemente doente. Ao contrário do que muitos fantasiam, não tirei de letra. Não sei o porquê, mas existe uma ideia estapafúrdia de que quem está com câncer tem que, pelo menos, parecer herói. Nãnãninã não! Quem recebe uma notícia dessas não consegue ter pensamentos belos. Bem… eu não conseguia. A cobrança de positividade acabou se tornando um problema. Olhava-me no espelho branca, magrela e de cabelos curtinhos (antes de caírem) e achava que estava pronta para fazer figuração em “A lista de Schindler”. Achava que não tinha chance de sobreviver à cirurgia, só pessoas que não tinham maus pensamentos sobreviviam. Muitas vezes deixei de comprar coisas para mim porque tinha que deixar tudo para minha filha. Bem, se na minha cabeça era esse o pensamento que reinava… Sem chance.
O mundo moderno é incrível. Tudo é maravilhoso, não existe sofrimento! As separações são sempre amigáveis e sem lágrimas, as mães não têm mais o direito de embarangar e ficar em casa lambendo a cria. Um mês depois estão lindas, magras, com barriga sarada! Os atores não ficam desempregados, estão sempre felizes com um convite que ainda não pode ser revelado! Quimioterapia é moleza! Vem cá, só eu que não moro na Disney?
Hoje percebo que precisei viver esse luto. Ele passou. Apesar do medo, fui confiante para o hospital. Mas outras angústias vieram. Sofri pelo que é “o de menos”, chorei pelos cabelos, pelas sobrancelhas, pelos cílios e pelo… resto que vocês sabem. Chorei pelas dores, enjoos, injeções e tudo mais. Eu me dei esse direito. Eu me dei o direito de ser humana. A Mulher Maravilha mora na televisão, eu moro na Gávea mesmo. A Mulher Maravilha dá aquele giro e sai linda e poderosa correndo para salvar pessoas. Se eu fizesse a mesma coisa, cairia estabacada com a careca no chão. Então meu giro foi bem devagarzinho, segurando na mão de minha mãe, de minha irmã e de meus queridos amigos e familiares. Girei amparada por Dr. Eduardo Bandeira, por Virginia Portas, Dr. Celso Portela e todos os enfermeiros e profissionais de saúde que foram maravilhosos comigo.
Marcia Cabrita.
Leia o texto na íntegra no jornal O Globo.
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