Um artista, ao pé da letra, é aquele que se lê, relê e se reinventa todos os dias. Nesse sentido, a impermanência pode ser um vetor do autoconhecimento. É o que aparenta ocorrer com o cantor Tiago Iorc que pela segunda vez andou “sumido”, tendo reaparecido agora com novo visual e uma música classificada nas redes como “sincerona”.
A música é “Masculinidade” e traz tantas e tão necessárias reflexões sobre o que é “ser homem” nos dias de hoje, que seria impossível discorrer aqui sobre metade dos temas abordados na canção.
A música veio a calhar tendo sido publicada em todas as mídia agora, no mês de novembro, quando se observa o “Novembro Azul”, discutindo temáticas sobre a masculinidade e a prevenção de doenças como o câncer de próstata.
Em resumo, a música pareceu uma catarse do próprio artista, que inicia dando pistas disso ao falar do próprio sumiço: “Eu tava numa de ficar sumido”. A partir de então, discorre sobre sobre dezenas de inseguranças trazidas a si pelo conceito de masculinidade que culturalmente nos é imposto. Diz da imagem que se viu obrigado a construir sobre si mesmo a partir desse conceito:
“Eu cuido pra não ser muito sensível
Homem não chora, homem isso e aquilo
Aprendi a ser indestrutível e que hoje”.
Contudo, ele assevera: “Eu não sou real”
A letra aparenta percorrer os caminhos trilhados em sua busca por sua própria essência. As imagens alternam dança e dor, enquanto ele nos convida a cuidar das nossas emoções:
“Cuida, meu irmão
Do teu emocional
Cuida do que é real”
Repressão, medo, culpa… Um emaranhado de emoções emanam da letra. Reflexões que nos levam a discutir aspectos inerentes a todos os humanos. Nós, pobres mortais, que temos “almas profundas” que “se afogam no raso”:
“Minha alma é profunda e se afoga no raso”
Ouçam a música e deixem aqui os seus comentários. Logo abaixo do vídeo, eis a letra, em sua integralidade, para a sua reflexão.
Música por TIAGO IORC, MATEUS ASATO, TOMÁS TRÓIA, LUX FERREIRA
Letra por TIAGO IORC
“Masculinidade
Eu tava numa de ficar sumido
Dinheiro, fama, tudo resolvido
Fingi que não mas na verdade eu ligo
Eu me achava mó legal
Queria ser uma unanimidade
Eu quis provar minha virilidade
Eu duvidei da minha validade
Na insanidade virtual
Eu cuido pra não ser muito sensível
Homem não chora, homem isso e aquilo
Aprendi a ser indestrutível
Eu não sou real
Conversando com os meus amigos
Eu entendi que não é só comigo
Calar fragilidade é castigo
Eu sou real
Cuida, meu irmão
Do teu emocional
Cuida do que é real
Cuida, meu irmão
Do teu emocional
Cuida do que é real
Masculinidade frágil, coisa de menino
Eu fui profano e sexo é divino
Da minha intimidade, fui um assassino
Que merda…
Quando criança, era chamado de bicha
Como se fosse um xingamento
Que coisa mais esquisita
Aprendi que era errado ser sensível
Quanta inocência
Eu tive medo do meu feminino
Eu me tornei um homem reprimido
Meio sem alma, meio adormecido
Um ato fálico, autodestrutivo
No auge e me sentindo deprimido
Me vi traindo por ter me traído
Eu fui covarde, eu fui abusivo
Pensei ser forte, mas eu só fugi…
E caí na pornografia
Essa porra só vicia
Te suga a alma, te esvazia
E quando vê passou o dia
E você pensa que devia
Ter outro corpo, outra p*ca
A ansiedade vem e fica
Caralho, isso não é vida!
Cuida, meu irmão
Do teu emocional
Cuida do que é real
Cuida, meu irmão
Do teu emocional
Cuida do que é real
Meu pai foi minha referência de homem forte
Trabalhador, generoso, decidido
Mas ele sempre teve dificuldade de falar
O pai do meu pai também não soube se expressar
Por esses homens é preciso chorar
E perdoar…
Essa dor guardada
Até agora, enquanto escrevo
Me assombra se o que eu digo é o que eu devo
Um eco de medo
O que será que vão dizer?
O que será que vão pensar?
A rejeição ensina cedo
Seja bem bonzinho ou então vão te cancelar
Que complexo é esse? Mamãe, é você?
Me iludi nessa imagem, tentei me esconder
Eu só posso ser esse Tiago
Cheio de virtude, cheio de estrago
Que afago crescer, aceitar
Ai, ai…
Esse homem macho, machucado
Esse homem violento, homem violado
Homem sem amor, homem mal amado
Precisamos nos responsabilizar, meus amigos
A gente cria um mundo extremo e opressivo
Diz aí, se não estamos todos loucos
Por um abraço
Que cansaço
Cuidado com o excesso de orgulho
Cuidado com o complexo de superioridade, mas
Cuidado com desculpa pra tudo
Cuidado com viver na eterna infantilidade
Cuidado com padrões radicais
Cuidado com absurdos normais
Cuidado com olhar só pro céu
E fechar o olho pro inferno que a gente mesmo é capaz
Cuida, meu irmão
Do teu emocional
Cuida do que é real
Cuida, meu irmão
Do teu emocional
Cuida do que é real
Minha alma é profunda e se afoga no raso
Minha alma é profunda e se afoga no raso
Minha alma é profunda e se afoga no raso
Eu fico zonzo
Fico triste
Fico pouco
Fico escr*to
Eu sigo à risca
O que é ser homem
Isso não existe
A vida insiste
O tempo todo
Que eu repense
O que é ser homem?
O que é ser homem?
O que é ser homem?
O que é ser homem?
O que é ser homem?
Há tantos e tantos
E tantos e tantos e tantos
Possíveis homens
Homem real e não ideal
Ser homem por querer se aprender, todo dia
Dominar a si mesmo
Apesar de qualquer fobia: respeito
Tem que ter peito
Tem que ter culhão pra amar direito
Vou dizer que não?
Esperando sentado por salvação?
Conexão, empatia, verdade
Divino propósito: responsabilidade
Deitar a cabeça no travesseiro e sentir paz
Por ter vivido um dia honesto
Ah…
Ser homem exige muito mais do que coragem
Muito mais do que masculinidade
Ser homem exige escolha, meu irmão
E aí?”
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