Em meio à grave crise política que o nosso país tem atravessado, pelo menos, desde 2014, e que vem arrastando consigo nossa economia, levando milhões de pessoas ao desemprego e elevando o clima de insegurança, a saúde mental do nosso povo, em resposta, tem se deteriorado profundamente. Nosso país está doente, em vários sentidos. O mais recente diagnóstico veio da OMC (Organização Mundial da Saúde): somos oficialmente o país mais ansioso do mundo.
Segundo os dados da Organização, cerca de 18,6 milhões de brasileiros sofrem, hoje, com o transtorno. Em consequência, a industria farmacêutica cresce a passos largos, e a opinião dos especialistas se divide: por um lado, uma parcela dos intelectuais que se debruçam sobre o problema entendem que a assim chamada “epidemia de diagnósticos” é, por si só, um problema, e que o recurso aos psicotrópicos não é a melhor maneira de enfrentarmos, enquanto sociedade, o problema. Por outro lado há quem considere a medicalização do transtorno uma alternativa eficaz, e argumente sobre a importância de vencermos o tabu que se formou a respeito do consumo de remédios psiquiátricos.
Esta segunda posição parece ser a de Daniel Martins de Barros, psiquiatra do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo, para quem a resistência de uma parcela da população ao consumo de remédios psiquiátricos se explica pelos mitos criados a respeito do tema: “As duas frases que eu mais ouço na clínica são ‘eu não queria tomar remédio’, na primeira consulta, e ‘eu não queria parar de tomar os remédios’, na consulta seguinte. A gente tem muita resistência porque existem muitos mitos: ficar viciado, bobo, impotente, engordar”, disse o psiquiatra, conforme informa a revista Veja.
Entre os que sustentam que a medicalização (não só da ansiedade, mas do sofrimento, em geral) tem ganhado contornos epidêmicos no Brasil e que é preciso combater a cultura do diagnóstico estão, por exemplo, Leandro Karnal, historiador, que já há algum tempo argumenta, referindo-se especificamente ao consumo de psicofármacos no contexto educacional, que “se o aluno não consegue acompanhar as aulas, dão remédio para ele. Nem todo mundo que não presta atenção tem déficit de atenção. A aula pode ser chata mesmo”. Outro nome de destaque entre os que questionam o recurso frequente à medicalização do sofrimento é Viviane Mosé, filósofa, psicóloga e psicanalista, que em vídeo viralizado há alguns anos (clique aqui para assisti-lo) promove duros ataques a essa forma de abordar o problema.
De qualquer maneira, parece evidente que a situação em que nos encontramos, enquanto povo, em relação aos problemas referentes à nossa saúde mental, estão em larga medida vinculadas ao contexto histórico em que estamos inseridos. Se quisermos, portanto, reverter esse quadro, talvez o debate deva transcender a esfera puramente individual. Talvez nem a medicalização dos indivíduos que sofrem de ansiedade (ou de outros transtornos), nem terapias psicológicas que excluam ou minimizem o recurso a psicofármacos, resolvam, ao fim e ao cabo, o nosso problema.
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