Não foi sem motivo que o poema abaixo viralizou na internet como homenagem à menina Ágatha Félix, de 8 anos. Ela foi baleada por policiais na sexta (20), no Complexo do Alemão, zona norte do Rio, quando voltava para casa com a mãe.
Ocorre que a onda estatal reacionária e irresponsável faz da população que deveria ser protegida o seu alvo primeiro. Quantas outras Ágathas, meninas humildes e negras, moradoras de zonas urbanas das quais o poder público pouco se lembra ao distribuir ao elaborar as suas diretrizes e ao disponibilizar o produto de nossos impostos, precisarão morrer para que percebamos que existe, entre nós, um silencioso Apartheid.
Nelson Mandela leu, quando então presidente na abertura do parlamento na África do Sul, em 1994. A tradução é de Maria Helena Malê.
Fica o registro da nossa homenagem à pequenina Ágatha!
“A criança que foi morta a tiros por soldados em Nyanga
(Ingrid Jonker)
A criança não está morta!
Ela levanta os punhos junto à sua mãe.
Quem grita África! brada o anseio da liberdade e da estepe,
dos corações entre cordões de isolamento.
A criança levanta os punhos junto ao seu pai.
Na marcha das gerações.
Quem grita África! brada o anseio da justiça e do sangue,
nas ruas, com o orgulho em prontidão para luta.
A criança não está morta!
Não em Langa, nem em Nyanga
Não em Orlando, nem em Sharpeville
Nem na delegacia de polícia em Filipos,
Onde jaz com uma bala no cérebro.
A criança é a sombra escura dos soldados
em prontidão com fuzis sarracenos e cassetetes
A criança está presente em todas as assembleias e tribunais
Surge aos pares, nas janelas das casas e nos corações das mães
Aquela criança, que só queria brincar sob o sol de Nyanga, está em toda parte!
Tornou-se um homem que marcha por toda a África
O filho crescido, um gigante que atravessa o mundo
Sem dar um só passo.”