Não há nada mais viscoso e peçonhento que a intolerância. Quando nos deparamos, nos mundos concretos em que vivemos ou no mundo virtual, com um intolerante, não raro a nossa primeira inclinação é nos contagiarmos de tal intolerância. Como é difícil tolerar quem a ninguém tolera!
Para justificar a intolerância, a ignorante se vale de etiquetas. O indivíduo já não tem mais o interesse de conhecer o outro, de ouvi-lo, de tentar ampliar as suas verdade (já que são absolutas) entrando em contato com a verdade alheia. Ele fica ali, de espreita. Um mero elemento que o leve a crer que o interlocutor mereça esta ou aquela rotulação e a vaidade o cega, a arrogância o arrasta às palavras de baixo calão e o outro já é um “esquerdopata”, um “facista”, um “coxinha”, um “batedor de panela”.
Partindo do pressuposto de que é em tudo maior do que o outro por não possuir, em sua fronte, tal etiqueta, ele passa rapidamente do desprezo ao ódio.
O que fazer quando nos deparamos com tais indivíduos? Odiar a quem odeia é equiparar-se a ele. Ser intolerante com os intolerantes não seria o lugar comum em uma sociedade essencialmente hipócrita?
Mahatma Gandhi, grande libertador da Índia e um dos grandes disseminadores dos princípios da “resistência pacífica” e da “não-violência”, afirmava que para segui-lo era necessário que não fizessem mal aos inimigos (opressores de seu povo), que não dissessem mal dos inimigos e, acima de tudo, que não pensassem mal dos inimigos. Ele assim ensinava, pois, para criarmos uma sociedade não violenta, precisamos primeiro nos abster de toda e qualquer violência verbal ou mental.
Há no mundo pessoas que ainda desconhecem a sua própria essência e se dedicam a explicitar a sua pior versão de si mesmas. Quando penso nisso, lembro-me de uma pequenina história que ouvi há muito:
Narra a lenda que dois monges caminhavam rente ao rio quando um deles avistou um escorpião que se afogava. O jovem apressou-se e, de ímpeto, tentou retirar o escorpião da água com sua própria mão e o escorpião o pica. O monge, sob o impacto da dor, deixa o escorpião novamente cair na água. Logo em seguida, o mesmo monge olha e o escorpião está a ser levado pelas correntezas e então, valendo-se de um galho, novamente retira o escorpião do rio e o coloca a salvo…
Seu discípulo, que a tudo observava, aproximou-se do monge e o recriminou:
– Mestre, o senhor deve estar muito doente! Porque foi salvar esse bicho ruim e venenoso? Que se afogasse! Seria um a menos! Veja como ele respondeu à sua ajuda, picou a mão que o salvara! Não merecia sua compaixão! Eu deixaria o ingrato se afogar.
Depois de escutá-lo, ainda se refazendo da dor, o paciente mestre respondeu amorosamente:
– Amigo, minha tarefa é ajudar. Ele agiu conforme sua natureza e eu de acordo com a minha.
Que a intolerância alheia não nos faça renegar a nossa natureza. E que muitos ousem ofertar do seu néctar mesmo àqueles que só destilam veneno.
Pazes a todos!