Ando inquieto há uns dias, às voltas com essa seleção de fotos, parece que me acostumei a não compartilhar nada.
Não sou um bom apreciador de fotos, nada capturo, deixo pros bons, aparecer nelas de preferência nunca, mas gosto de olhar as pessoas, me faculto o direito de opinar que o melhor da arte fotográfica é a retratação de gente, pazeia, a mim sim, a mim me acalma.
E ver um rosto desconhecido, de feições outras, tão harmonicamente estabelecidas numa cultura até então desconhecida nos afasta da incolumidade mental, o que é bom.
Senti pena do moço asiático da capa, embora a pena não seja bom sentimento atribuo aqui a ela a função da aproximação com base na solidariedade que, acredito, é dos mais nobres sentimentos humanos.
Algumas dão pena, outras fascinam, fui dormir outro dia fascinado enquanto lembrava desse filho de Brahman que figura aí, debaixo de toda essa barba, esse trambolhão enorme na cabeça, meu deus, numa pinta danada de boneco do The King of Fighters.
Outras ainda me extasiaram, como a de um trabalhador de mina de carvão que aparece expirando seu cansaço no fumo de um cigarro, os dedos longos, pretos cor de piche, as unhas bonitas mesmo tão sujas (é que mãos bem feitas sempre me fascinaram).
Enfim, as rugas dos velhos, a cor negra das peles de África, os olhos puxados, os corpos cheios de álcool, a perseverança de filho para com o pai, a paciência de filho para com a mãe, a tinta tribal que corre a pele, os fuzis nas mãos de meninas que têm que proteger a família fazendo frente a um Estado opressor, fundamentalista e assassino e que me traz à memória o discurso A solidão da América Latina, texto em que García Márquez chama atenção para o fato de ser eu, aquecendo o estômago para uma canja detrás do meu computador, uma cifra determinada pela sorte.
Enfim somos nós, para quem a roda gira, por quem os sinos dobram.
Já dizia Protágoras há vinte e cinco séculos – e faculto-me esse outro direito, o de acreditar na validade de tal afirmação com o fanatismo característico de quem bate o pé e diz “nem não”: É o homem, com toda sua brutalidade, com toda sua vilania, com tudo, é o homem a medida de todas as coisas.”
(Adriano Braule Pinto)
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